1ª Semana On-line de Montanhismo Ultraleve (SOLMU)

Seljalandsfoss - Islândia

Autor: Rogério Alexandre

No transcorrer dos 6 dias da semana de 30/6 a 5/7 uma intensa jornada de palestras abarcando desde os fundamentos e conceitos da filosofia do Montanhismo Ultraleve até as ações a se tomar quando as coisas resultaram mal. Tratou-se de comunicação eficaz e de baixo custo, dos prós e contras dos diferentes sistemas de vestimentas e abrigos, desde barracas, tarps e bivaques, de como reduzir o peso ao máximo gastando o mínimo no cenário brasileiro. Os diferentes sistemas de cozinha e algumas das receitas clássicas e leves foram trazidos à discussão com suas vantagens e fragilidades inerentes. Foram apresentados fornecedores nacionais e seus processos de desenvolvimento, discutido como a comunidade UL pode contribuir na evolução dos equipamentos frente às restrições que o mercado nacional apresenta.

Após as considerações da Priscila Passos, organizadora dessa primeira edição virtual, os trabalhos foram iniciados com a palestra do Rodrigo Rodrigues sobre a história do montanhismo ultraleve “Introdução do UL no Brasil”, mediada pela Passos, onde apresentou-se os conceitos envolvidos, os percussores dessa mentalidade, entre eles nosso bravo Sérgio Beck, quiçá o primeiro médico brasileiro a sistematizar a parte de PS em trilhas e montanhas. Alguns paralelos entre a evolução da prática ultraleve, bem como as motivações entre os diferentes cenários, aqui e no exterior foram traçados.

O escritor Marlon Schunk (Associação da Serra Geral Montanhismo-ASGEM) trouxe na palestra Experiências em Travessias de Longo Curso suas percepções sobre essa modalidade de trekking, a gênese do Caminho das Araucárias e os desafios que as grandes extensões impõem ao esportista, notavelmente contornadas com o emprego da filosofia UL. As experiências do escoteiro são objeto de seu livro “NO CAMINHO DAS ARAUCÁRIAS”, discorrendo sobre os pouco mais de 500 km atravessando toda a região de cânions do sul foi e relatando aspectos históricos, geológicos e culturais das terras percorridas. A apresentação teve, com a mediação da Priscila, foco nos aprendizados de mentalidade UL e equipamentos que os dois anos de preparativos somados aos 22 dias em campo trouxeram ao escritor – montanhista – escoteiro.

A paranaense Avi Rocha (Alto Estilo) com a mediação da Priscila Passos trouxe, em sua apresentação, Mochila UL e Sua Evolução, a história do desenvolvimento dos produtos da marca desde os momentos iniciais da empresa, focada em produtos para escalada até o momento atual, em que a linha de produtos recebe atualização frequente, com as melhorias identificadas pela equipe de desenvolvimento e pelos usuários de teste de desde os primórdios da empresa. As limitações que os processos de produção de inovações precisam lidar, desde a etapa de conceito, protótipo, desenvolvimento de fornecedores nacionais – valor para a Alto Estilo, validação de materiais, ajustes nos equipamentos, testes de campo, produção em escala e marketing foram abordados, ilustrando as complexidades envolvidas e explicitando que a superação desse gap entre o “produto desejado” e o “produto disponível” apenas pode ser superado através da intensa e efetiva comunicação entre os usuários (esportistas) e os desenvolvedores (empresas).

Estado hospitaleiro por natureza, a Bahia mostra-se propícia para o montanhismo UL pelo clima ameno, além de áreas belíssimas para a prática do trekking. Na palestra, Chapada Diamantina, Arredores Travessias Longas, Peter Tofte e Marcelo Melo (CEU) apresentaram trilhas na Chapada Diamantina, nas Serras Altas e na Serra de Jacobina, focando naquelas de longo curso e mais selvagens. Também se tratou dos equipamentos UL recomendados e dos riscos percebidos nesses locais.

Da sabedoria da minha saudosa Vó Graziela, fiquei com o aprendizado de que “saco vazio não para em pé”, então tratei de acompanhar atentamente a palestra do segundo dia, Sistema de Cozinha e Receitas pela dupla Felipe Vitória (OmaGear) e Rodrigo Rodrigues. Iniciaram apresentando os sistemas de cozinha mais presentes no rol de equipamentos UL para, em seguida, passar algumas receitas “clássicas” obtidas com emprego de alimentos liofilizados ou desidratados.

Escapando ao extremo da postura perdulária que por vezes vicia o esportista, o hebiatra Rodrigo Rodrigues, com a mediação da Dianna Almeida, tratou na palestra UL Mão de Vaca, o “como” montar um conjunto de equipamentos leves, otimizando cada real dispendido. Mais do que indicar equipamentos ou marcas, critério per si inadequado às melhores escolhas, apontou alternativas e abordagens funcionais para a aquisição dos materiais, pensando nos materiais acessíveis no mercado nacional.

Na quarta, Rogério Alexandre (Malucos da Amantikir – MDA) e Márcio Salvatti trataram do tema Comunicação e Segurança em duas palestras complementares e sequenciais, uma primeira generalista e voltada às diversas formas de comunicação disponíveis para o esportista, seguida de um aprofundamento orientado ao emprego de uma rede legalizada de radiocomunicação. Discorreu-se sobre o emprego de meios analógicos/mecânicos como apitos, sinais visuais corporais ou luminosos, livros de registro nos cumes e nas bases das trilhas. Equipamentos como celulares, comunicadores satelitais e radiocomunicadores foram apresentados e comparadas suas vantagens e limitações. A questão da clareza na transmissão das informações foi trabalhada frente às possíveis divergências na toponímia dos atrativos visitados, bem como na conveniência do conhecimento pelos praticantes de atividades outdoor do alfabeto fonético da OTAN.

Na quinta feira, foi a oportunidade de conhecer melhor as tecnologias, qualidades pretendidas e limitações atuais nos Sistemas de Abrigos e Vestimentas, na qual a dupla Rodrigo Rodrigues e Marlon Machado apresentou de forma ampla e, ainda assim minuciosa, os balizadores de desenvolvimento de barracas, tarps, bivaques e roupas. Apresentou-se as características intrínsecas dos materiais, as complexidades de processamento e emprego no mercado nacional e, de forma prática, quais conjuntos de equipamentos se mostram mais oportunos para as realidades brasileiras.

O último dia de palestras da semana foi iniciado com a temática “Bike Ultraleve” com o cicloativista Douglas Silva apresentando o emprego da filosofia UL no cicloturismo. Considerando que, por vezes, as distâncias envolvidas nessa atividade são bastante expressivas e que a propulsão humana tem restrições discorreu-se sobre diferentes abordagens quanto ao arranjo dos equipamentos na bicicleta, as dificuldades e estratégias na questão dos acampamentos e lida com as diferentes dificuldades vividas a bordo de uma magrela. A mediação do Marcelo Melo, do Centro Excursionista Universitário - CEU trouxe contrapontos, percepções e experiências complementares, enriquecendo a discussão.

Na sequência, o médico e montanhista Alexandre Charão, do Clube Excursionista Carioca discorreu sobre o emprego da mentalidade UL no tocante às atividades verticais, na palestra Escalada Ultraleve, apresentando materiais nacionais e abordagens alternativas às clássicas para a redução de peso.

Concluindo o rol de palestras da 1ª SOLMU, a segunda palestra do Charão, trouxe o conceito de mínimo peso à um elemento tão crucial quanto descuidado nas mochilas de muitos montanhistas: a parte de Primeiros Socorros. Discorreu sobre os eventos mais presentes nas atividades outdoor, estratégias de minimização e contingenciamento. Baseado em sua experiencia em montanhismo e na formação acadêmica, o médico estimou o peso de kits minimalistas, cobrindo as principais necessidades de um aventureiro, em 200 gramas para 4 pessoas por 5 dias. Considerou-se, para essas estimativas um “leigo treinado”, ou seja, alguém não profissional de saúde, mas que tenha absorvido os conhecimentos necessários para proceder o primeiro atendimento à uma eventual ocorrência.

Após a sequência de perguntas, a Priscila procedeu ao encerramento do evento, conclamando que os montanhistas interessados no trilhar responsável, busquem informações nos clubes de montanhismo, como o Centro Excursionista Universitário- CEU, o Clube Excursionista Carioca – CEC, o Clube Paranaense de Montanhismo – CPM e o Clube Alpino Brasileiro – CAB.

Destacou aos montanhistas interessados na filosofia UL e que pretendam reduzir o peso de suas cargueiras, maximizando o conforto e a segurança que podem se informar através dos canal do Youtube Graxain Congelado ou dos andandoleve@gmail.com e brasilultraleve@gmail.com. O grupo de WhatsApp Montanhismo Ultraleve, organizador desta 1ª SOLMU e do encontro presencial no Itatiaia em 2023, congrega entusiastas na filosofia e iniciantes. Também se deliberou pela hospedagem das mídias produzidas durante a semana nas páginas https://www.ultralevebrasil.com e https://semana-ultraleve.blogspot.com/.

Conforme conheci mais amiúde o universo do montanhismo ultraleve, uma singularidade me chamou atenção: dos percussores da aplicação e divulgação dos princípios, a maioria tem formação médica: Beck, Rodrigues e Charão. O Maurício, do Graxain Congelado, por sua vez, é engenheiro. Apenas coincidência ou essas carreiras demandando grande precisão e assertividade nas ações e decisões, tornariam esse zelo com os gramas consequência natural? Seja como for, agradeço a cada um, no seu tempo e na sua dedicação pelos (muitos) ensinamentos.

Para finalizar esse texto, teço uma loa à Priscila Passos que, frente aos contratempos que tornaram inviável a execução do segundo encontro presencial, não se entregou e buscou soluções se desdobrando para concatenar os muitos desafios envolvidos na organização desta 1ª SOLMU. Os registros de acessos e participações tornam evidente o acerto da solução adotada e trazem alvissareira expectativas para os eventos futuros, em modo presencial ou virtual.

Autor: Rogério Alexandre

Imagens ilustrativas: Freepik.com

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